11.9.08

Do segundo amor [parte 3]




Ele teve medo.
Era 1967 e teve medo: os pais da mocinha eram muito severos, e ele nunca conseguia chegar nem ao portão. A mocinha, ainda no ginásio, ele acompanhava com olhos ávidos toda manhã, antes de ir ao trabalho. Trabalhava nos Correios, sempre trabalhou.
Perversa ironia: nunca carta alguma que mandara estivera nas mãos da moça.
Tentou de um tudo, no entanto mais correto seria dizer que tentou de tudo, até um certo período em que, rendido aos insultos dos amigos, saiu de si e caiu na vida.
Dizia mesmo que caíra na vida por não ter mais esperanças, desistira.

Teve 202 mulheres, casou-se 3 vezes, 5 filhos havidos dos dois bons casamentos. 2 vezes viúvo, e por último separado: só pensava na mocinha do ginásio, que a essa altura devia ser como ele - velha e perdida, mas ainda a mocinha do ginásio.
Ele com 60 e tantos, ela devia ter uns 7 a menos (vai saber...), e no alto dos seus 60 e tantos, sentado na cadeira esdrúxula, contava as pílulas.

Cada uma era uma lembrança. E ele esperava, tão avidamente quanto observara a mocinha da janela, que a cada pílula uma lembrança se fosse, acabando de vez com aquela tortura que tinha vivido desde que sucumbira ao Medo.

Nenhum comentário: