31.5.12

bloco do prazer

e se eu te disser que sonhei a noite inteira, que quase não acordei, que agora já nem sei, que apenas me pergunto se devo ir... mas ir aonde, não é? parece, meu bem, que quero o oito e o oitenta. oitenta carnavais, veja você, será que vou viver? oitenta sonhos desses não aguento.

mas quando eu te disser que o mundo é enorme, enorme, enorme, enorme e sempre nos cabe? vou fazer com que caiba sempre, mesmo se doer, mesmo se acabar. não ando bem das idéias, meu amor, preciso parar de sonhar.

um dia eu vou te dizer, e não sei se você ouve. um dia vou te beijar, e não sei o que vai dar - me preocupo, mas parece que espero. eu andei muito tempo por aí, perdido, alucinado, com músicas nos pés, e tudo o que eu queria era dizer.

as frases me foram presas no peito, querida. só vou te dizer que quero o oito e o oitenta, e não sei onde vou parar.

19.5.12

não tenho


Nada em meu nome,
Nada a esconder,
um tempo inteiro a cumprir,
um mundo enorme a viver,
um monte de sonhos,
quartos e quadros ao montes,
montanhas verdes-vivas

não tenho, menina,
mas é de tanto ter.

Não tenho, aliás, sequer Antônio.
Tenho Karina, tenho tempo e não tenho

não tenho, menina,

Nada em meu nome, a não ser lembranças.

10.5.12

às vezes, só às vezes, pode ser mais simples do que parece. :)

8.5.12

aquela velha música repetida, senhores. ela insiste, ela volta, volta sim, no agudo daquele clarinete, ela vem se fazendo estridente, alta, inspiradora, desesperadora... ela vai aparecer sempre que quiser, sabem? sempre que der na telha. Sim, quedernatelha.

vai tocar quantas vezes inventar, sempre que qualquer mínimo pensamento deixar aberta qualquer fresta - ela vai dar um jeito, queridos. alta, enebriante, precisa e vaga, vai ocupar todo e qualquer espaço. o espaço é dela, o tempo também. Sim, vai rasgar todos os espaços, não vai deixar nada inteiro.

nada intacto, intocado, permanecido. vai embaraçar o que estiver quieto, e aquietar o que estiver louco: vai tirar toda e qualquer ordem.

vai ser corpo e vai ser alma, senhores, vai ser o que ela bem entender.

7.5.12

nem tudo cabe nas palavras, já percebeu? há encantos gigantescos que não cabem, e impaciências enormes também.

6.5.12

Carta a seis de maio,

Caro amigo,

Ontem eu vi um farol, um farol enorme, sabe? E desde então preciso muito escrever. Acho que preciso dizer, soltar, dar vazão a um tudo gigante que tenho em mim. Parece que sempre me vi ora mui pequena, ora gigante, uma enorme distorção de imagem... Então agora fico no caminho. Chamei de Desatino do Norte e Desatino do Sul, mas é porque li num livro, um livro lindo, lindo, lindo, dos mais lindos que já vi na vida. Pois sim, permaneço bem no meio, e não são muitos que vão entender. Tu, talvez, mas não teria tanta certeza.

Desde já adianto que, caso não entendas, não acho mesmo ser culpa tua. É que eu sou em códigos, parece, não só palavras em código: eu inteira. Desde criança parece que gosto, faço disso graça, até acabar acreditando. Bobagem te dizer, se já me conheces... Acho graça, mais uma vez. Felizmente te escrever é uma alegria, começo um desespero e termino rindo, te agradeço antes mesmo de dizer.

Escuta, preciso te contar duas coisas. Uma é que voltei pra minha casa, deu tudo certo. Aquela casa que eu tanto procurava, sabe? Uma casa em mim. A outra é que voltei a dançar. Eu que tinha jurado nunca mais... Lembras? Quebrei a promessa, João. Quebrei, mas também não foi só a promessa, acho que andei quebrando mais coisas. Pena que isso também seja conversa pra outra carta, caro amigo, é coisa demais pra te contar.

Ah, tinha ainda uma terceira coisa por dizer! Não ando boa de contas, veja só. É que estou pensando em ir te ver, que te parece? Daqui a umas semanas, quero conhecer o teu recanto. Ou terei a alegria de tua visita antes? Andas me devendo. Muitas coisas, devo dizer, mas não cobrarei. Hoje não é dia de cobrar, querido, é de ser, apenas. Espero, só espero, que essa carta não tarde a chegar.

Por último, um regalo. Reparei no antigo diário uma frase que achei bonita. Vai pra ti: "Passava assim as noites, sobretudo as noites, esperando sem esperar que o tempo deixasse de ser tempo com o barulho das asas que queria ter."

Que tenhamos asas, João.
o rio abriu, menina. não sei nem onde vai dar, vou arriscando, só sei que o rio abriu... antigamente eu tinha medo de nadar, hoje eu vou é navegando. cada curva ou desvio é uma nota que vou tocar, sem nem saber quem vai ouvir.

o meu rio tem cordas, menina. tem notas, tem silêncios, tem absurdos. ninguém vai ver sentido, porque aliás ninguém vai ver. o rio é meu, tenho dito, e acabou-se.

compartilho brevemente essa paisagem, mas só por um suspiro. assim que passar, serei eu de novo, novamente o rio passando por mim. forte, impiedoso, vezenquando violento. mas não dói, dói não - porque o rio, menina, também sou eu.

5.5.12

da embriaguez

Você nunca vai saber. De todas as cartas, de todas as mensagens, os sublimes, os olhares, subliminares, tudo o de não dito: você nunca vai saber. Não vai saber, porque às vezes a gente é muito mais movido do que de fato se move. Nem vai saber porque jamais ousou ser dito, e porque não viu as folhas ao vento, nem sentiu o vento, nem ouviu dizer. Vezenquando somos só aquilo que...queremos ser. E nas outras (maioria talvez), ninguém nem pensa, só vai seguindo. Terá sido isso? Se foi, já foi. E todo o vinho já derramou no mar - é conformar, João, pois você nunca vai saber.

flower não é flor

É quando eu vou sair atrás daquela folha ao vento, o movimento me chamando. A viagem vai ser de caravela ou de brasília, vou até a Patagônia, vou bem alto, vou bem longe, longe, longe! Só pra ter a alegria de voltar. Sou aquela folha ao vento, o movimento, o chamamento...Só sei que tem música, pra onde eu vou. Tem violão, tem viola, tem vitrola - tem meninos, tem meninas, tem descobertas, aventuras, desventuras, maravilhas. E se eu for a folha ao vento? E se você for? Eu me arrisco a ver qual é.

O medo não é meu forte, graças aos deuses do desatino. Desatino do norte, desatino do sul - eu fiquei bem no meio. Desatino do meio do mundo, eis aqui o meu destino: o mundo, o desafio, ser assim como essa folha. De vento, de tempo, reinvento.

1.5.12

dia de chuva

Um quadro: à beira mar, num banco branco, um vestido vermelho e sobre ele um passarinho. Ao fundo, uma menina com uma boneca na mão. Ao lado e ao longe: poesia, muita poesia, transbordando o mundo e, ao mesmo tempo, represando o mundo. É céu e é mar, transbordando tudo...

- ao som de “Dia de Chuva”, Ceumar.

as várias vitórias - em 26.04.2012

É o nome dela, vitória. Na verdade, são várias outras – todas elas juntas num só ser: é assim que ela se conta. Mas, parando pra pensar, realmente são outras: na casa são quatro vitórias, e ela ainda anda com elas na mão. Ela gosta de carregar vitórias, sem nem parar pra pensar nos significados imbricados, somados, entrelaçados – tudo que está envolto nessa ideia dela com vitórias na mão. Um milhão de tessituras... um milhão de curvas, de esquinas, de paredes onde se esconder. De brincadeiras, de contratempos, de passatempos – e de biscoito! Ela é criança, é tão menina, mas tão intensa, tão, mas tão viva.

A menina vai saracoteando por todos os espaços que encontra. Os silêncios que ela acha vai preenchendo, do jeito que arranja, do jeito que dá. É uma graça que ela acha em qualquer coisa, mas não ingênua: que bobagem pensar isso. Ela tem, não esqueçamos, quatro vitórias na mão. E quanta gente anda no mundo com suas bagagens cheias de orgulhos, prêmios, memórias, medalhas, e, no entanto... Do que realmente se orgulhar?

Ela não está, nesse exato momento, pensando em nada disso. E mesmo assim vai, com suas quatro vitórias na mão. Agora, com dois chocolates no bolso, que não é besta nem nada – mas aprendeu, anteontem, que é melhor ter um pássaro na mão que dois voando. Discordou, mas aprendeu. E continua mantendo seus dois pássaros voando e suas quatro vitórias na mão.